Folha - O modelo da presidente Cristina Kirchner chegou a um limite?
Roberto Lavagna - Sim, ela está se beneficiando de uma época de crescimento econômico e de superávits, usando os frutos para construir uma política populista. Houve um desvio do modelo adotado em 2002. A partir de 2007, não houve mais investimento em produção e concentrou-se muito dinheiro em subsídios. Enquanto isso, a alta inflação corrói a economia. Está tudo muito integrado, e tudo muito mal.
A política de restrições para conter a fuga de capitais é correta?
Não, porque é ineficiente e porque está afetando a produção industrial. Há setores que estão muito interligados, se falta algum componente, a produção toda se suspende. Os carros, a construção, os laboratórios estão sofrendo uma queda na produtividade que faz com que seja mais grave o problema cambiário.
A Argentina vem caindo nos rankings de investimento estrangeiro. Isso é grave?
Os investimentos estrangeiros são importantes por fazer um aporte à tecnologia e em termos de abertura de mercado para ajudar o país a se integrar à economia mundial. Porém, não são o mais importante. O mais grave problema da Argentina hoje é a fuga de capitais. Para isso mudar, apenas fazendo com que o nível de confiança interno cresça. As pessoas precisam sentir confiança no país e não procurarem refúgio no dólar.
A presidente ganhou a eleição com 54% dos votos. Ainda assim, as pessoas seguiram apostando no dólar. Não é contraditório?
Sim, mas é dessas clássicas dicotomias que existem na Argentina. Por outro lado, não havia oferta na oposição, então muitos votaram em Cristina sem acreditar que o governo manteria a economia nos eixos.
Como o sr. vê o protecionismo adotado por países do Cone Sul? Está afetando o Mercosul?
O Mercosul já não existe mais do ponto de vista da política. Cada país está preocupado consigo mesmo. Estão colocando restrições uns aos outros. Talvez a Argentina esteja fazendo isso de maneira mais radical, mas o Brasil também está.
Em seus últimos discursos sobre política externa, Dilma não menciona o Mercosul. Fala da Europa, dos Brics, da China, mas não pronuncia a palavra "Mercosul". Do lado de cá também não vejo debate sobre o bloco.
O Mercosul não forma parte das preocupações, das agendas prioritárias dos países. Seguem os rituais, mas as reuniões são cada vez menos relevantes. Tudo o que não avança, retrocede. É o que está acontecendo com o Mercosul.
Com relação às travas à importação, o governo brasileiro age com a tal ªpaciência estratégicaº, não reclama das medidas argentinas. Enquanto isso, caminha para um outro lado, se afasta.
Como o sr. avalia a expropriação da YPF?
O princípio não é errado, mas deveria ter sido atingido com um método diferente, negociado, e buscando uma fórmula como a da Petrobras.
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