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QUANDO A FICÇÃO É REALIDADE



Não é difícil demonstrar o quanto a literatura enriquece as línguas. Basta lembrar as diversas palavras que nasceram nos livros, para batizar personagens ou lugares imaginários, e acabaram incorporadas à linguagem cotidiana. Um dos melhores exemplos é a Odisséia, poema épico do grego Homero, que teria vivido no século IX a.C. A obra narra as atribuladas aventuras de Odisseu (mais conhecido como Ulisses), que tenta voltar para casa após a Guerra de Tróia. Por dez anos, de ilha em ilha, de naufrágio em naufrágio, ele enfrenta canibais, ciclopes, feiticeiras e monstros marinhos, até conseguir, por fim, retornar a sua amada Ítaca. Poucos, talvez, tenham lido a versão integral desse clássico da Antiguidade, mas os infortúnios e peripécias de seu herói são, até hoje, fonte de expressões como "foi uma verdadeira odisséia voltar da praia nesse feriadão".


Balzaquiana
No século XIX, quando as heroínas da literatura casavam antes de completar 21 anos, o francês Honoré de Balzac causou furor com o romance A Mulher de 30 Anos (1831), que exalta mulheres mais maduras, atraentes não só fisicamente, mas também por se encontrarem na plenitude de sua feminilidade as famosas "balzaquianas". De lá para cá, porém, os limites desse conceito se expandiram na mesma medida em que a qualidade de vida, a cosmética e a cirurgia plástica resguardam a beleza dos efeitos da idade. Para representar, hoje, uma balzaquiana, a escolha recairia em um atriz como Vera Fischer ou Betty Faria.


Quixotesco
O famoso Dom Quixote de la Mancha (1605), do espanhol Cervantes, narra as aventuras de um fidalgo de aldeia que enlouquece lendo livros de cavalaria. Em suas várias andanças - uma verdadeira odisséia! -, ele enfrenta inimigos e monstros imaginários, como no famoso episódio dos moinhos de vento, contra os quais investe de lança em riste, tomando-os por gigantes perigosos. Apesar de seus continuados fracassos, o bravo Quixote não desanima de sua missão de cavaleiro andante, o que faz o termo "quixotesco", até hoje, uma forma de se referir, com simpatia, a pessoas de intenções e ideais nobres, mas sonhadoras e desconectadas da realidade.


Liliputiano
O irlandês Jonathan Swift escreveu As Viagens de Gulliver (1726) como uma sátira feroz à sociedade mas a obra ficou mais conhecida pela primeira das quatro viagens, que passou a ser lida como uma aventura infanto-juvenil. Nela, o cirurgião Samuel Gulliver naufraga na costa de Lilliput, terra onde tudo é pequenino: os homens medem 14 centímetros, os cavalos têm 12 centímetros e as ovelhas, só 4 centímetros. O adjetivo "liliputiano" passou a significar, desde então, todo tipo de miniatura.


Acaciano
O ridículo Conselheiro Acácio não passa de um coadjuvante em O Primo Basílio (1878), romance do português Eça de Queirós. Ainda assim, seu hábito de proferir pomposamente as sentenças mais óbvias e banais deu origem às expressões "frases acacianas" e "verdades acacianas". Quem já ouviu algum comentarista esportivo dizer coisas como "se entra, é gol" ou "em futebol, ou se ganha, ou se perde, ou se empata", sabe do que estamos falando.


Pantagruélico
Criado pelo francês François Rabelais, Pantagruel é um gigante comilão, desbocado e gozador, que já nasce mamando diariamente o leite de 4 600 vacas. Volta e meia, ao longo dos Horríveis e Espantosos Feitos e Proezas do Renomado Pantagruel (1532), aparecem comilanças e bebedeiras em torno de mesas repletas de boas carnes, iguarias e vinho abundante. Por isso, usa-se uma "refeição pantagruélica" ou um "apetite pantagruélico" sempre que queremos designar qualquer exagero gastronômico.


Big Brother
O romance 1984, do inglês George Orwell, escrito em 1948 (o título apenas inverteu os dois últimos algarismos da data), descreve uma sociedade em que não existe mais liberdade nem privacidade. Todos os cidadãos são controlados pelo Partido, cujo líder é aclamado como o Grande Irmão. Nesse pesadelo futurista, os aparelhos de TV, além de receber as imagens transmitidas pelo governo, servem também para espionar a vida familiar dos espectadores e gigantescos cartazes anunciam por toda parte: "O Grande Irmão está de olho em você!" A partir daí, a expressão "Big Brother" passou a designar esse tipo de poder que tenta controlar os sentimentos e a consciência de cada um - até batizar um dos mais famosos reality shows da TV mundial.

Comentários

Unknown disse…
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